O homem moderno vive uma vida onde a velocidade e a constante movimentação lhe dão o sentido. Ficar parado é estagnar no tempo, portanto não se desenvolver. Não me admira a lógica civilizacional ser a do constante, ininterrupto e progressivo desenvolvimento e crescimento. Parar, ou estagnar, vai de contra essa ordem. Nossas vidas são tão movimentadas que chegam a ser entediantes. Já nos acustumamos com a correria de forma que ela se tornou a nova estagnação. Mas ainda assim, pensamos que o problema está na velocidade em que dirigimos nosso cotidiano e não na necessidade ou não de se manter em movimento. Afinal, o que fazemos quando estamos entediados de nossas vidas corridas e atarefadas: procuramos novas coisas para fazer. Trocamos sempre o veículo por um que seja mais rápido, mas dificilmente nos perguntamos se precisamos mesmo dele, ou se precisamos dele tão veloz quanto é ou pode ser.
Esse idéia pode ser perebida na fragilidade dos laços afetivos. Temos a necessidade de abalar nossa quietude particular com uma relação, temos necessidade de se relacionar com outros. Mas temos grande dificuldade de nos manter nessa relação por muito tempo, pois abala a ordem da movimentação constante. Isso abala o fluxo da vida, que deve estar sempre em movimento, nascendo, morrendo e renascendo.
Abdicar da solidão por um relacionamento é como abdicar de um ciclo – uma forma de viver – e começar a construir outro. Desistimos desse ciclo de solidão por designarmos que ele não nos fornece mais a emoção e os sentimentos necessários para nos fazer seguir em frente. Assim buscamos os sentimentos que nos faltavam em um novo ciclo, no caso, em um novo relacionamento. Porém, o nosso apego a esses ciclos é totalmente artificial. Não se trata de realmente buscar em cada um deles o que nos falta por dentro, mas sim, continuar se movimentando, afinal, essa movimentação é revestida por nossa cultura por um aspécto de progresso e melhoramento. Assim, todos os ciclos se mostram insuficientes e por isso destruimo-los, buscando cada vez mais e mais ciclos, sempre na busca infinita pela auto-satisfação afetiva. Isso fragiliza nossa capacidade de se aprofundar em nossas relações – e talvez até mesmo de se aprofundar em outras experiências da vida que não sejam necessariamente afetivas. Não nos preocupamos em aprofundar nossas relações porque sempre podemos buscar o que falta no próximo da fila. E assim vivemos, sempre em busca de encontrar novas experiências afetivas nos relacionando com pessoas ou grupos, mas nunca nos aproximamos ou aprofundamo-nos o suficiente para poder perceber o que realmente vale a pena nessa relação. Apenas buscamos superficialmente o que procuramos, sem nem mesmo sabermos ao certo o que é. Destruimos esse laço com facilidade porque nunca nos esforçamos para fortificá-lo. Por ser tão frágil, quebramo-os e partimos para outra relação, ou seja, desfazemo-nos do velho ciclo e trocamos por um novo.
Talvez seja ousado dizer que isso é produto da cultura à que estamos inseridos (ou talvez não). Talvez seja ainda mais ousado tomar uma atitude contra isso. Mas, o mínimo que podemos fazer, aceitando esse fenômeno da fragilidade afetiva, é tentar buscar o que nos falta não no relacionamento ao lado, mas sim, talvez, em uma camada mais profunda do relacionamento atual.
Independente disso, alguma coisa precisa ser feita, ou nossos filhos correm o risco de serem ainda mais bizarros socialmente do que nós somos hoje.
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Ass: MagrO
Gostei da preocupação com a fragilidade dos laços afetivos. Se eu puder dar uma contribuição, eu quero dizer que também é importante saber quando é preciso desistir de um relacionamento insustentável. Porque o caso é que de nada adianta ficar tentando manter uma coisa que não é verdadeira. E um dos motivos pelo qual os relacionamentos não duram é que eles iniciam do modo errado, eles se fundamentam nas coisas erradas, e mal fundamentados eles são como um projeto que, cedo ou tarde, se revelará inviável, impossível de manter, não importa o quanto tentemos. Então, para valorizar a durabilidade de um relacionamento, nós temos que prestar muita atenção naquilo que está na base do relacionamento. Se a base não é firme, talvez seja necessário acabar com ele, e talvez começar do zero, em novas bases, se ainda houver interesse mútuo.
ResponderExcluirUm relacionamento precisa de uma coisa: cumplicidade. Se um não está disposto a defender o outro ao custo do seu próprio bem-estar, se não está disposto a permanecer junto nos momentos de necessidade, mesmo que prefira estar em outro lugar, ou mesmo que seja perigoso ficar junto, então não há cumplicidade. E o que vemos nos relacionamentos modernos é um atacando e acusando o outro, mesmo que de "brincadeira", o tempo todo. Um competindo com o outro por qualquer coisa. Um querendo manipular o outro. Um abandonando o outro na primeira chance que tem de obter mais prazer em outro lugar. Isso também fragiliza os relacionamentos, porque ambos fazem uma espécie de pacto de não-cumplicidade (cada um faz o que quiser sem precisar se limitar pelo outro), e aí depois ficam reclamando que não são compatíveis, que o amor acabou, que há brigas, ciúmes, traições. Oras, não há como haver compatibilidade nem confiança sem cumplicidade. Se você não sabe se o seu parceiro vai te delatar para seu inimigo na primeira chance que tiver, como confiar nele?
E cumplicidade não é fechar-se num ciúme doentio, mesmo que mútuo ou socialmente aceitável, onde cada um cria obstáculos para impedir o outro de se relacionar com outras pessoas. Infelizmente, muitos dos relacionamentos afetivos e amizades que duram muitos anos se mantém com base nessa espécie de invólucro herméticamente fechado ou sociedade secreta, em que todo elemento estranho que se aproxime demais começa a ameaçar a paz e a saúde do relacionamento. Isso revela a mentira, e nenhum relacionamento baseado na mentira e na ausência de liberdade é sustentável, por mais que possa se arrastar por anos.
Portanto, para valorizar a sustentabilidade de um relacionamento, não adianta tentar manter a durabilidade a qualquer custo. Tanto no relacionamento sem liberdade quando no relacionamento vago e solto demais, o que falta é cumplicidade.
Postarei esse comentário também no blog http://amorliquidolivro.blogspot.com/
Abraços
Olá,
ResponderExcluirEntendo sua contribuição com a questão da urgência da cumplicidade dentro de um relacionamento. Porém, não vejo outra forma de descobrir ou desenvolver uma verdadeira cumplicidade senão fortalecendo os vínculos entre ambas as partes.
Vejo pessoas reclamando que não conseguem achar uma sintonia entre o relacionamento "sem liberdade" e o "vago e solto", mas percebo que estas mesmas pessoas buscam uma cumplicidade, que seria o agente capaz de desenvolver essa sintonia, apenas na superfície da relação. Sem um bom aprofundamento ou comprometimento com o relacionamento torna-se, ao meu ver, impossível encontrar alguma base sólida que possa fazê-lo florescer e se tornar sustentável.
Mas acho que entendo o que você quis dizer. Com certeza existem casos onde o aprofundamento da relação só pode levar à perda de tempo e à possíveis estragos decorrentes dessa busca em vão. Afundar mais a mão em um saco vazio não te fará encontrar o fundo. Mas creio que é necessário se encontrar um meio termo entre essas duas opiniões. Acho que é muito importante se ter um contato mais aprofundado e comprometido, fortificando os laços de afetividade mútuos, porque só assim poderemos saber quando um relacionamento pode ou não ser sustentável. Quando pode ou não florescer e se manter a cumplicidade necessária para garantir uma união sádia e segura.
Obrigado pelo cometário.
Vou dar uma olhada no blog indicado.
Abraço.
Olá,
ResponderExcluirConcordo com você e não quis nem por um momento negar a importância de se aprofundar e se comprometer e fortificar os laços afetivos. Pelo contrário, é essa disposição mútua que de fato é a base sólida. Então não são duas opiniões distintas, mas a mesma opinião. Acontece que nenhum dos dois lados pode "fortalecer o vínculo entre ambas as partes" sozinho. Cada um só pode ir até a metade do caminho, e ele cai no vazio se o outro não for até a metade também, para se encontrarem no meio. Se só um dos lados faz o esforço e o outro não, então não é possível fortalecer o vínculo, porque de fato não há vínculo, há movimentos desconexos. Você pode se comprometer, mas não pode obrigar o outro a se comprometer, e esta é a questão: saber se o outro tem a mesma disposição que você.
As pessoas ficam tão machucadas com relações mal fundadas que passam a preferir a certeza da insustentabilidade (e que amor de verdade é conto de fadas e tudo deve ser transitório e "sem apego") do que se arriscar a uma nova decepção. Isso fale para todos os tipos de relacionamento, não apenas entre namorados, o que explica a ênfase da sociedade moderna em se relacionar em redes.
Olá. Adorei o texto e o blog. Gostei também dos comentários deixados. Escrevi sobre casamento em meu blog e adicionei o link para este post. Muito bom! Abraços
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