A atual realidade
está formada, como nunca esteve, de imensas tristezas e de cinismo: “uma grande
lágrima no coração da humanidade”, como disse Richard Rodriguez. O quotidiano
vê aumentar a sua dose de horrores sem cessar acompanhada por um apocalipse
rompante do meio ambiente. A alienação dos espíritos e os poluentes químicos
disputam o predomínio na dialética da morte que rege a vida de uma sociedade
dividida e gangrenada pela tecnologia. O câncer, desconhecido antes da
civilização, transformou-se numa epidemia numa sociedade cada vez mais estéril
e literalmente maligna.
Repentinamente, todos
estarão usando drogas; sejam administradas sob regras ou vendidas sob
contrabando, isto apenas é uma distinção formal. O Transtorno de Déficit de
Atenção é um exemplo do esforço opressivo para medicar a angústia e agitação
generalizada causadas por uma vida-mundo cada vez mais atrofiada e
insatisfatória. A ordem dominante fará, evidentemente, todo o possível por
negar a realidade social. A sua tecnopsiquiatria considera o sofrimento humano
como de natureza biológica e de origem genética.
Novas patologias,
resistentes à medicina industrial estendem-se à escala planetária da mesma
forma que o fundamentalismo (Cristão, Judaico, Islâmico) - sintoma de um
sentimento profundo de miséria e frustração. Aqui em casa a espiritualidade New Age (a “filosofia para estúpidos",
segundo Adorno), assim como as inumeráveis terapias alternativas, deleitam-se
em vãs ilusões. Pretender que pode-se estar completo/iluminado/curado no seio
da loucura atual é, de fato, aceitar esta loucura.
O fosso entre ricos e
pobres alarga-se, particularmente, nesta terra de sem-tetos e presidiários. A
cólera aumenta e as negações em massa, fundamentos da sobrevivência do sistema,
estão tendo, no mínimo, um sono conturbado. Este mundo, onde reina a falsidade,
encontra apenas a adesão que merece: a desconfiança em direção às instituições
é quase absoluta. Mas a vida social parece congelada, e o sofrimento dos jovens
é sem dúvida o mais profundo. A taxa de homicídios entre adolescentes de 15 a
19 anos duplicou entre 1985 e 1991. O suicídio transformou-se em reação de
procura de cada vez mais adolescentes, que evidentemente não conseguem imaginar
a maturidade em um lugar como esse.
A cultura
esmagadoramente difundida é uma cultura fast-food,
desprovida de conteúdo ou compromisso. Como Dick Hebdige apropriadamente
julgou, “a pós-modernidade é a modernidade sem as esperanças e sonhos que
tornaram a modernidade suportável”. O pós-modernismo se anuncia como pluralista,
tolerante e não dogmático. Na prática, é um fast-forward
deliberadamente confuso, fragmentado, obcecado pela mídia, analfabeto,
fatalista, excrescência acrítica, indiferente às questões de origens, agência,
história ou causalidade. Ela não questiona nada de importante e é a expressão
perfeita de uma configuração que é estúpida e suicida, e quer levar-nos com ela.
A nossa época
pós-moderna encontra a sua expressão essencial no consumismo e na tecnologia,
que dão aos mass media a sua força
estupefaciente. Imagens e slogans impactantes e fáceis de digerir impedem de
ver o show de horror da dominação que é mantido por este tipo de
entretenimento, imagens e frases de fácil digestão. Inclusive os enganos mais
flagrantes da sociedade podem servir para esta empresa de hipnose coletiva,
como é o caso da violência, fonte de infinitas diversões. Seduzem-nos as
representações de comportamentos ameaçantes, o que sugere que o aborrecimento é
uma tortura ainda maior que o espanto.
A natureza, ou o que
resta dela, serve como um lembrete amargo de quão deformada, insensível e
fraudulenta é a existência contemporânea. A morte do mundo natural e a
penetração da tecnologia em todas as esferas da vida, ou o que resta dela,
desenvolvem-se a um ritmo cada vez mais rápido. A multidão informaticamente conectada,
os marginais tecnóides, os ciber-não-importa-quê, a realidade virtual, a
inteligência artificial, etc... Até chegar à Vida Artificial, última ciência
pós-moderna.
Entretanto, a nossa
Era da Computação "pós-industrial" tem como principal consequência a
nossa transformação acelerada num "apêndice da máquina", como se
dizia no século XIX. As estatísticas do FBI indicam, todavia, que as empresas,
cada vez mais informatizadas, são o teatro de cerca de um milhão de delitos
violentos por ano, e que o número de patrões assassinados duplicou nos 10
últimos anos.
Esse arranjo hediondo,
em sua arrogância, espera que as suas vítimas se contentem em votar, reciclar
os seus resíduos e fingir que tudo vai ficar bem. Para usar uma linha de
Debord, “o espectador é somente suposto, não tem de saber nada e não merece
nada”.
A civilização, a
tecnologia e as divisões sociais que dilaceram a sociedade, são componentes de
um todo indissolúvel, uma viagem para a morte que é fundamentalmente hostil às
diferenças qualitativas. A nossa resposta terá de ser qualitativa, sem fazer
caso dos eternos paliativos quantitativos que reforçam, de fato, aquilo que
queremos abolir.
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(Panfleto de Anti-Authoritarians Anonymous, Eugene, 1995.)
Fonte: Actions Speak Louder Than Words - Derrick Jensen
Tradução: Coletivo Erva Daninha
Fonte: Actions Speak Louder Than Words - Derrick Jensen
Tradução: Coletivo Erva Daninha
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