Imaginem o potencial de transformação humano em uma sociedade em que as pessoas agem mediante reflexões criticas de seus atos em concepção global. Imaginem as mudanças estruturais que poderiam surgir em decorrência de uma simples mudança de postura nas ações cotidianas. Imaginem uma sociedade que, diferente de nossa sociedade atual, não se deixa levar pelo fluxo da ordem social vigente.
Esta é uma utopia que, se comparada com outras por ai, nem é tão utópica assim. Pensar e se auto-questionar criticamente é a única revolução que esta utopia necessita para se tornar realidade. Ainda assim, essa revolução parece ser tão sonhadora quanto qualquer outra já proposta na história do pensamento.
Estamos acostumados a viver em um mundo de plástico. Tudo em que tocamos, sentimos, vivemos e acreditamos torna-se produto e seu processo de criação restringe-se ao processo de produção indústrial (inclusive para o que NÃO é industrial). Até mesmo os sentidos tornam-se “produtos industriais”. Em um cotidiano super-veloz nos tornamos escravos dos relógios e fragmentamos nosso dia-a-dia em tantas partes cronometradas que mal podemos enxergar a nossa vida como um todo. As experiências humanas tornam-se artificiais, plásticas. Aparentar ser é mais proveitoso do que realmente SER. Nessa sociedade (que se pretende acéfala), os fins nunca justificaram tanto os meios.
A cultura de nossa civilização é bem clara quanto a isso. Jacques Ellul, um filósofo francês, diz: “Nossa cultura estimula o reflexo, e não a reflexão.” O reflexo é o novo inimigo da reflexão. Agir primeiro, pensar depois (ou, às vezes, “agir primeiro e, depois, agir novamente”) é o que nosso cotidiano e o ambiente em que vivemos nos estimulam a botar em prática. Quantas pessoas se auto-criticam antes de fazer uma critica ao outro? Quantas vezes tentamos pensar na cadeia de processos que desencadearam nas ações que praticamos diariamente? Quantas vezes nos preocupamos com as conseqüências de nossos atos e costumes?
Essas são perguntas que pouco se ouve na sociedade em que vivemos. Salvo algumas poucas exceções, como a Universidade, que apesar de se propor como um espaço de elaboração de métodos de transformação social, apenas reproduz os mesmos valores que compõem a cultura responsável pela criação e disseminação dos problemas que tenta combater; os movimentos sociais, que apesar de necessários e, em certo grau, eficazes, se restringem a um assistencialismo desesperado que pouco contribui para uma mudança de paradigmas sociais; e, creio que por fim, os partidos políticos que, por motivos óbvios, não têm a mínima pretensão de mudar a ordem vigente. Logo, levanto outra pergunta: Onde está a reflexão? O que aconteceu com ela? Foi esquecida, legada, subtraída? Tornou-se monopólio das elites intelectuais? Foi ceifada da sociedade como um todo ou nunca a sociedade a teve?
Essas são perguntas que não posso responder, pelo menos não com certeza. Alias, nem vem ao caso responder todas elas. A pergunta realmente pertinente ao momento na verdade é: ONDE FOI PARAR A SUA REFLEXÃO?
Apenas três hipóteses me vêm à cabeça no momento: sua reflexão está adormecida, aprisionada em uma jaula bem forte e que, por desuso, tornou-se alheia a você; ou ela não existe, foi ceifada por completo ou nunca lhe foi atribuída (o que, obviamente, acho pouco provável); e, por fim, sua reflexão é atuante em você, porém, é massacrada e transpassada pela pressão exterior. Em outras palavras, você usa sua capacidade de reflexão, mas seus reflexos (fortemente exercitados pela cultura em que vive) são mais fortes e esmagam qualquer tentativa de atuar reflexivamente.
Você deve estar perguntando onde eu quero chegar com isso. Em lugar algum. Esse é um exercício de reflexão, e não uma ação de reflexo. Meu objetivo não é passar uma idéia, mas sim contrapor a sua e combatê-las dialeticamente a fim de obter um resultado mais satisfatório e sensato. Esse é um exercício de como agir no dia-a-dia para fugir da tendência a não-refletir sobre os atos e conseqüências da vida. Nunca poderia saber o que esse texto poderia gerar ao entrar em contato com sua visão sobre o assunto, mas, com certeza (supondo que você seja uma pessoa sensata que sabe escutar e aproveitar as diversidades de saberes), será uma visão mais reflexiva e coerente sobre o assunto.
PS: “Se discordou de alguma coisa é porque o processo de construção de um saber reflexivo deu algum resultado, logo, seja uma pessoa inclusiva e compartilhe conosco o seu ponto de vista, ele será escutado com atenção.”
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Ass: MagrO